Sarah Lorenk questiona o belo através do estranhamento

Artista visual usa seu trabalho para questionar padrões e lugares impostos às mulheres na sociedade

 

Por Patrícia Mamede

 

Figuras imperfeitas, exageradas, fragmentadas e extraordinárias: essa é a essência do trabalho de Sarah Lorenk, artista norte-americana, filha de brasileiros. Suas obras são verdadeiras provocações que, por meio do estranhamento, questionam as regras do que é considerado belo pelo senso comum.

Como ocorre com todo artista, a experiência de vida de Lorenk foi sua grande professora. Seu rompimento com a ideia de traços perfeitos vai muito além do desejo de criar uma estética que se diferencia. A semente de sua pesquisa foi plantada ainda na faculdade, na Bob Jones University, nos Estados Unidos, onde cursou artes visuais. As regras rígidas que enfrentou dentro do ambiente academico incluíam exigências como: “usar saias, vestidos, não podia [mostrar] quatro dedos abaixo da clavícula, não podia se relacionar com o mesmo sexo”, e por aí vai.

 

 

O ambiente acadêmico, que deveria ser um suposto cúmplice do crescimento, mostrou-se conservador. Expandir-se tornou-se algo aterrorizante e excessivamente domesticado, repleto de imposições sobre o comportamento, a vestimenta e a postura que definiriam o “ideal” ao qual uma mulher deveria corresponder.

Adulta, Sarah decidiu usar da sua arte para romper com essa estética formatada e controlada que lhe era imposta; o corpo ideal, simétrico, domesticado. Hoje, sua pintura propõe um convite à beleza da falha, da dobra, do excesso e do verdadeiro. Suas personagens são figuras com narizes grandes, orelhas desproporcionais, seios assimétricos e posturas relaxadas.

 

 

Mas esse jogo de transgressão estética não surgiu de maneira gratuita. Além da universidade, Sarah cresceu em um ambiente fortemente marcado pela religiosidade cristã, outra instituição que acredita no ideal da mulher pura e, por vezes, pune as mulheres por seus desejos e domam qualquer possibilidade de liberdade. 

“[Estava] sempre pensando em como eu podia me cobrir para não me sexualizar […] Eu sempre achava que a beleza do corpo era vista de uma forma sexual.”

A entrada da artista no balé clássico reforçou ainda mais a disciplina corporal, a subserviência, o controle dos movimentos e da aparência, se mostrando extensões simbólicas da repressão religiosa. No entanto, Sarah pôde perceber algo diferente e libertador na dança, uma liberdade que a artista não encontrou nas rezas nem na academia, “No balé a função do corpo ela é diferente do que a gente via. Era muito uso de força, de arte, de dança”.

Apesar do collant, uma vestimenta que revela as pernas e não deixa espaço para a imaginação, a dança tratava o corpo como instrumento, com um propósito maior. O movimento ajudou Sarah a se desvencilhar da noção de que a exposição da pele deveria ser automaticamente associada a qualquer contexto sexual.

“Na vida adulta você vai percebendo ainda mais que o corpo segura emoções, inteligência, personalidade e alma, sabe? Tem muito mais por trás disso.”

Ao pintar corpos que não obedecem à lógica da beleza normativa, Lorenk devolve ao corpo feminino sua complexidade, capacidade e potência. Sua arte questiona a culpa, a vergonha e propõe ao espectador uma reflexão sobre o lugar hiperssexualizado em que as mulheres são colocadas na sociedade.

 

 

A filosofia artística de Lorenk é, também, uma ética de vida. Sua ambição não era se rebelar contra as instituições, mas oferecer uma nova proposta: “Eu estava querendo, na verdade, fazer uma nova proposta que algo diferente pode ser bonito também […] eu acho que eu só estava querendo abrir mais a mente.” Produzir com mais liberdade e viver com mais honestidade.

 

 

A mente mais madura é aquela que consegue aconchegar várias formas de pensar.”

Ao final da entrevista, Sarah compartilha uma situação de quando foi pintar em uma cidade sobre a qual nada sabia, e a viagem seria longa, com aproximadamente quatro dias de estrada. Ela se deu conta de que havia esquecido de olhar no mapa para onde estava indo e lembrou a si mesma que não saber era um luxo do qual não podia se permitir, “Sarah, olha no mapa para onde você está indo”, repreendeu a si mesma. Este momento pareceu sintetizar bem a narrativa de toda a sua história, o questionamento lhe servindo sempre como primeira bússola.

Se quiser conhecer mais o trabalho de Sarah Lorenk, clique aqui e navegue por suas criações. 

Imagens: Sarah Lorenk

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