Artista brinca com reflexos e iluminação em suas obras e provoca um olhar diferente para situações do cotidiano
Por Patrícia Mamede
Nascido e crescido no Jardim Miriam, Leandro, mais conhecido como Le Asap, passou a maior parte de sua vida distante dos luxos espalhados pela grande São Paulo. Cresceu cuidado pelas mãos dos verdadeiros trabalhadores brasileiros, sua mãe, secretária e seu pai trabalhava com cópia e impressão. No entanto, um único recurso lhe permitiu visitar todas as riquezas presentes em sua imaginação, “sempre tinha muito papel em casa”.
Quando ganhava de sua mãe um boneco ou um carrinho, o filho levava a brincadeira toda para o papel, “[eu] desenhava o boneco, recortava, ficava brincando com o recorte; com o desenho”. Nas salas de espera, grande inimiga das crianças, a mãe de Leandro levava sempre na bolsa seu melhor amigo, o caderno, que lhe fazia companhia e permitia fazer do tempo, também, um companheiro.
Já crescido, quando então as salas de espera não eram mais inimigas e o tédio havia se tornado suportável à idade, o avô de Leandro ficou doente. Nesta época, cursava arquitetura e trabalhava em um escritório, mas abdicou do trabalho para cuidar do avô, “a gente ficava muito tempo juntos e tinha um momento do dia em que a gente ia tomar sol na sacada onde eu morava, e eu voltei a desenhar mais”.
Então chegou a vez do tempo lhe arrancar a companhia e seu avô faleceu, foi quando “eu tive aquele insight de que a vida é uma só”. Certo de que o relógio, mais cedo ou mais tarde, possivelmente lhe levaria também os sonhos, se demitiu oficialmente do emprego e decidiu apostar a sorte no caminho da arte, uma vez que que desenhar sempre foi algo espontâneo e natural, “eu não lembro de uma fase da vida que eu não estava desenhando”.
No começo, a fim de construir uma carreira e pensando como poderia se mobilizar para tornar sua arte conhecida, Leandro perguntava a todos se ele poderia pintar seus muros, “depois de quarenta ‘nãos’, pegava os três ‘sims’ e dava a minha vida ali”, naqueles trabalhos. Naturalmente, oportunidades foram aparecendo.
Os trabalhos de Leandro jogavam com um campo lúdico e tinham por regra tons de preto, branco e cinza. Mas foi quando nasceu a sua filha que seu olhar para o cotidiano mudou e, consequentemente, levou os pincéis ao encontro de outras possibilidades, antes não exploradas, como as cores, a luz e o mundano. Vivendo em casa, ao lado da criança, o artista passou a observar o olhar da filha e se encantou com as descobertas de um despertar infantil.
“Eu vi a minha filha descobrindo a sombra, descobrindo a luz. E aí, no primeiro Natal dela, eu a vi descobrindo a luz artificial.”
O reflexo, o brilho e os pontos de luz são características fortemente presentes nas obras de Leandro. Hoje, sua arte é conhecida por imagens que registram trabalhos manuais, situações cotidianas e pessoas que, de alguma forma, lhe tocam de um jeito simples e belo, “eu comecei a ver beleza nisso, assim, no cotidiano”.
Dessa forma, Le Asap recria situações, à primeira vista banais, e muitas vezes invisíveis aos olhares alheios, e as transforma em pontos de atenção, evidenciando as belezas dos momentos por meio de seus contrastes luminosos. “Quando a fotografia ficou mais acessível para os nobres, os pintores começaram a pintar os camponeses de novo”, provoca. Sua escolha por retratar essas realidades nasce de uma proximidade com essas pessoas com quem dividiu a infância, as refeições e os sonhos.
“Talvez, se algum outro caminho eu tivesse tomado diferente, eu poderia ser o cara da pipoca. Esse cara tá no meu bairro […] Por alguma razão, por alguma coisa do destino, eu tive outras oportunidades e fui por outro caminho. Mas eu me vejo muito mais próximo dessa pessoa do que um trabalhador que é um cara que está num banco.”
O artista diz que, apesar de trabalhar com um estilo mais realista, propositalmente gosta de deixar certas imperfeições nas telas como forma de não descartar em absoluto a característica lúdica em suas produções. Atualmente, apesar de Leandro já ter trabalhado e ainda fechar trabalhos com marcas, ele reconhece que, agora, com menos fantasia e mais realidade, corre o risco de perder oportunidades que uma vez poderiam lhe ser concedidas por uma estética que conversasse mais com o design. No entanto, esse medo, até agora, é o que permanece fantasioso.
Recentemente o artista foi chamado para realizar um projeto para o programa Shark E-School, que chegou recentemente ao Brasil com sua primeira unidade presencial em São José do Rio Preto. Leandro foi convidado pelo hub de inovação artística, Dionisio.AG, para realizar a sua primeira empena e trazer a arte para dentro e fora da instituição e para perto das crianças, uma pintura da qual diz se sentir muito realizado de ter feito parte. O convite chegou para Leandro no início do ano de 2025, uma época que o artista diz ser muito difícil de conseguir fechar trabalhos, o que o deixou ainda mais emocionado.
“Eu já tinha trampado em várias empenas como assistente artístico e eu achava muito irado o jeito que a Dionisio levava as produções, então eu sempre pensei, ‘pô, se eu produzisse uma empena com esses caras iria ser irado!”
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Créditos das fotos: Patrícia Mamede e Leandro Asap.