Mestra e Doutora em Administração, Magali Colconi tem mais de 30 anos de experiência em marketing, atuando na implementação de planejamentos estratégicos nos setores industriais, varejistas e atacadistas.
Enfatizando o varejo, onde analisou o comportamento dos visitantes no ambiente interno de lojas, Magali desenvolveu estudos e projetos específicos de impacto. Atuou, também, como professora universitária de cursos de graduação, pós-graduação e MBAs, participando na formação de mais de 10.000 alunos, dos cursos de Comunicação, Propaganda, Relações Públicas, Marketing e afins.
Tendo atendido mais de 500 empresas e capacitado inúmeros profissionais de sucesso, Magali fez jus ao Hall da Fama da Abramark e respondeu às nossas cinco perguntas dessa semana. Confira!
Abramark – Como mestra e especialista na formação dos novos nomes do marketing brasileiro, como avalia o momento atual? Como estão os jovens talentos nesse cenário de muitas mudanças e alta velocidade?
MC – Sempre acreditei que é importante ter expectativas positivas. Com o momento atual isso não é diferente, vale essa prática, diariamente. Isso porque as relações sociais, econômicas e de produção continuam frágeis, velozes e flexíveis.
É importante que os profissionais se mantenham lúcidos sobre essa realidade. Estamos em uma modernidade líquida, vivendo um novo paradigma. E isso não é o resultado apenas do período da pandemia. Essas transformações começaram na década de 1960, como ponderado pelo filósofo Zygmunt Bauman.
De lá para cá, observamos profundas alterações na vida social, como o amor, a família, a cultura etc. O rompimento com o que era sólido provocou novos comportamentos. E, no mercado de trabalho, isso não foi diferente. Afetou jovens e velhos talentos!
Reconhecidas personalidades empresariais, exemplos de uma era de liderança rígida, passaram a ser consideradas como um padrão não mais ideal, necessitando de um reposicionamento imediato. Aliado a isso, verificamos maior concorrência entre as empresas, reduzindo a garantia de empregos seguros e carreiras longas em uma mesma organização.
Vimos surgir também uma grande variedade de modelos de negócios, inseridos em um sistema digital em ascensão. Então, é claro que a procura por novos talentos se tornou frenética!
Por outro lado, os jovens passaram a buscar o seu próprio estilo de vida, fazendo as coisas do seu jeito. E, para àqueles com recursos, tornou-se até mais fácil estudar ou trabalhar em outros locais pelo mundo.
Em 2021, uma pesquisa mostrou que 24% dos jovens das classes A, B e C com até 30 anos já são empreendedores e 60% querem ter um negócio próprio no futuro, entre estes: 67% que querem ter um negócio para se tornar independentes financeiramente e 39% para ter mais autonomia e não ter chefe.
Todo esse cenário parece muito interessante e promissor. Mas, assim como na física, no mercado líquido as certezas são mais fracas.
Questionamentos começaram a aumentar, tais como: é fácil conseguir uma boa oportunidade no mercado de trabalho, considerando-se somente o próprio estilo de vida e o jeito do candidato? Será mesmo que a atitude de não se comprometer com o que seja garante um bom trabalho ou resultado? Como aumentar a qualidade de vida, trabalhando o mínimo necessário, mas obtendo um bom ganho? É tranquilo e seguro ter bons resultados como empreendedor, abandonando as oportunidades de um trabalho remunerado?
Diante de incertezas e da pouca experiência profissional as dúvidas aumentam, as decisões tornam-se mais complexas, gerando inclusive quadros de muita ansiedade.
Mesmo nessa transitoriedade toda, vejo “luz no final do túnel”. Observo muitos jovens que tem experiências, intenções e resultados muito promissores. Com muita determinação e variáveis adequadas, eles vivenciam o sucesso, porque desacreditam em oportunidades mágicas e rápidas. Em vários setores, observo que eles buscam soluções. Aceitam o processo do seu próprio amadurecimento e desenvolvimento profissional. São os heróis dessa nossa época!
Abramark – O mercado de cursos e treinamentos já voltou ao ritmo pré-pandemia? Encontros presenciais serão, de fato, cada vez mais raros, ou ainda há espaço para eles?
MC – Sem dúvida, essa é uma pergunta bacana, porque me dá a oportunidade de mostrar que o mercado de cursos e treinamentos não estava com um bom ritmo no período pré-pandemia. Isso porque as empresas reduziram os investimentos anuais em treinamento e desenvolvimento dos seus colaboradores. E podemos analisar esses resultados em uma pesquisa da Associação Brasileira de Treinamento e Desenvolvimento (ABTD).
Em 2017, tínhamos o valor de R$ 788,00 de investimento médio anual por colaborador. Em 2018, era R$ 746,00 e, em 2019, o valor foi para R$ 625,00. De 2017 para 2019, a redução de 20,7% desse investimento foi bem significativa. Outra variável desta queda foi o número médio de horas anuais observado por colaborador: 15 horas de treinamento por indivíduo, em 2019, com uma queda de 17% em relação ao ano anterior.
Diante da queda dos investimentos em treinamento, minha percepção é que as empresas optaram por profissionais que já possuíam qualificação requerida no mercado de trabalho, em detrimento a projetos de treinamento de suas equipes, que por vezes exigia elevados investimentos.
Em 2019, considerando-se os meios e métodos usados pelas organizações, verificamos um fato interessante. De acordo com ABTD, pelo segundo ano consecutivo, o volume na modalidade presencial representava 71% e EAD com 23%.
Essa preferência deveu-se a alguns fatores: os treinamentos via EAD necessitavam de investimentos em tecnologia apropriada para efetivação dos projetos, além dos custos para desenvolvimento de conteúdo e equipe preparada para essas implantações. E, ainda, o aprendizado experiencial, prático, vivenciado no próprio ambiente de trabalho (on the job), onde o mote era “aprender fazendo”, era mais animador. Logo, treinamentos via EAD ficaram em segundo plano.
De modo geral, nos treinamentos com conteúdo não técnico é complexo identificar com precisão os resultados positivos ao longo do tempo. E essa pesquisa da ABTD ajuda a compreender isso, porque 68% dos treinamentos mediram os resultados obtidos por meio da avaliação de reação dos participantes. Somente 2% dos projetos tiveram avaliação de retorno do investimento e 7% foram avaliados por meio dos resultados atingidos.
A partir de 2020, a pandemia trouxe uma nova realidade. O modus operandi nas empresas teve que mudar, acelerando a necessidade de um sistema híbrido de trabalho (presencial e home office) por parte dos seus colaboradores. Em decorrência disso, houve uma mudança também no volume das modalidades oferecidas, ou seja, o treinamento presencial passou para 56%, seguido de 37% on-line (EAD), inclusive com a novidade de aula “ao vivo” (18% das horas on-line de treinamento).
Ao compararmos os dois distintos períodos acima indicados (2019 e 2020), temos um aumento de 60,8% em treinamento on-line (EAD), enquanto nos treinamentos presenciais observamos uma redução de 21,1%, (ABTD).
Paralelamente, devido à impossibilidade de aulas presenciais, os indivíduos também buscaram novos conhecimentos na modalidade on-line, investindo em diferentes cursos e treinamentos.
O Censo da Associação Brasileira de Educação a Distância (ABED) informou que, em 51 Instituições de Ensino, 34% delas viram um aumento significativo no número de matrículas dos cursos online, sendo uma tendência que veio para ficar, apesar dos dilemas que ainda possui.
Essa procura por cursos on-line também cresceu consideravelmente nas plataformas de hospedagem. Como exemplo, cito a Hotmart, com 161% do volume de compras, entre maio de 2019 e 2020 nesse mesmo mês. Já a Herospark teve um aumento de 1002% na busca por seus serviços, entre os últimos dois meses de 2019 contra 2020. Em 2021, a venda de cursos aumentou 60% entre janeiro e julho, na comparação com o mesmo período do ano anterior.
Como vemos, mesmo nesse período conturbado, há empresas que souberam aproveitar essa oportunidade de cursos e treinamentos e conseguiram “dar a volta por cima” de uma forma surpreendente.
É claro que treinamentos presenciais continuarão sendo oferecidos, assim como a modalidade on-line. Sempre haverá a oportunidade de uma solução mais antiga conviver com outra mais atual e até se mesclarem (blended). Mas o fato é que os cursos on-line vieram para ficar. Que se garanta quem duvidar disso!
O grande desafio para empresas e indivíduos, frente às ofertas abundantes de cursos e treinamentos, será optar por profissionais competentes, éticos, experientes, que possam assegurar as informações fornecidas. Mas essa decisão não parece fácil, diante das ofertas mágicas disponíveis também nas redes sociais. E assim, restará a dúvida: por quanto tempo durará esse resultado no aprendizado? Valerá o investimento?
Abramark – A polarização da sociedade como um todo, sobretudo nos temas relacionados à política, tem se intensificado nos últimos anos. Esse é um tema que costuma atrapalhar ou causar certo desconforto entre seus alunos ou grupos atendidos recentemente?
MC – Se o filósofo Sócrates (470-399 a.C.) fosse vivo estaria perplexo diante da nossa insensatez, no que se refere à polarização da sociedade. Para ele, o essencial era a arte de discutir, como forma de descobrir e compreender o mundo. Salientava que somente após a falsidade ser afastada é que a verdade poderia emergir. E, para se chegar à praticidade disso, propôs o método dialético, composto de três elementos: a tese, a antítese e a síntese.
A polarização é observada em várias áreas e situações. Portanto, considero-a como benéfica. Só se torna prejudicial quando temos resultados negativos à própria sociedade e aos princípios democráticos. E é isso que estamos vivendo no presente momento, apesar de 2.500 anos de repetições na nossa história.
Observamos uma polarização popular com atitudes de grupos distintos, posicionando-se com ideologias extremas, defendendo determinadas linhas partidárias, figuras públicas, entre outras coisas. Logo, questionam a legitimidade moral do grupo opositor, que passa a ser considerado como uma ameaça a um estilo de vida, a segurança, a nação etc. E até as redes sociais são usadas para mostrar os posicionamentos, legitimados por meio das indesejadas fake news nas redes sociais.
Essa é a nossa realidade. Sair-se bem nesse cenário exige um conjunto de competências, o que nem todos estão aptos ou decididos a enfrentar. Notamos muita oratória e pouca capacidade de escutar. E onde há a necessidade de se ter sempre a razão, a qualquer custo, à força, é fato que a confusão se instala.
Ao longo dos meus mais de 30 anos de vivência no ensino superior, em cursos de especialização, em treinamentos organizacionais, em consultorias e mentorias de negócios ou carreiras, aprendi que só se pode instruir àqueles que estão interessados em aprender algo. Portanto, se não houver comprometimento pelo conhecimento, creio ser impossível obter qualquer resultado positivo.
Nessas situações desconfortáveis, perante a alunos, clientes, amigos etc. acredito que o melhor é manter a lucidez, o bom senso, evitando embates, posicionamentos e ânimos exaustados, já que a razão é sempre um caminho de mão dupla.
Abramark – Aparentemente, o varejo já está novamente em velocidade de cruzeiro, com números e indicadores que permitem imaginarmos um 2023 promissor, apesar dos altos juros. Enquanto consultora, como você avalia esse cenário em médio prazo?
MC – Meus votos são de um 2023 promissor a todos! Mas a realidade nos mostra prudência.
A pandemia alterou significativamente os hábitos de consumo. E o aumento das compras observadas no e-commerce brasileiro, em 2021, é um bom exemplo disso. O faturamento chegou R$ 161 bilhões, com um crescimento de 26,9% em relação ao ano anterior e com 353 milhões de entregas (Neotrust).
Em 2022, foi estimado um crescimento no marketplace. As empresas voltaram a se preparar para este canal. Também haverá melhoria na interação do espaço físico com o digital, permitindo aumentar a eficiência nas compras, assim como na relação do consumidor com a loja.
As expectativas do setor varejista são promissoras. Prova disso são os resultados da pesquisa Future of Retail, onde o crescimento entre 2021 a 2025 é estimado em 42%, apontando também que 25% dos novos consumidores são da geração Z, nascidos entre 1995 e 2010.
Mas tanto o cenário interno como o internacional sempre afetam as nossas vidas e os nossos negócios. Por esse motivo, é indispensável ficar alerta para as variações do mercado e do comportamento dos nossos potenciais compradores.
Daqui para frente, esses movimentos serão mais bruscos e frequentes e as oportunidades de negócios serão mais transitórias. E a questão será: como iremos detectar e reagir a elas?
Tanto os profissionais como as empresas deverão compreender os novos momentos, posicionando-se de forma adequada. Desta forma, poderão acompanhar as transformações do mercado e crescer no mundo pós-covid.
Abramark – Que conselhos ou dicas deixa para os estudantes e novos profissionais de marketing e comunicação que desejam prosperar, crescer no mercado e deixar um legado?
MC – É fato que existem jovens talentos se destacando nas diferentes áreas, atuando como profissional em empresas ou empreendedores em seus negócios. Tenho observado que esse bom resultado se deve a um conjunto de fatores. Mas existem aqueles que se iludem ainda, buscando resultados rápidos, sem investir em: conhecimento, relacionamento, controle emocional, ética entre outras coisas.
Desenvolver novas competências e hábitos, se atualizar, ter propósito, metas, se comprometer consigo mesmo, participar de projetos sociais são as ações que presencio nos jovens que têm bons resultados em suas vidas. É um esforço contínuo! É um planejar e replanejar constante!
Acredito que há sempre uma saída para aqueles jovens que buscam soluções, sendo flexíveis e resilientes. Afinal, a conhecida frase de Charles Darwin faz muito sentido aqui e agora: “Não é o mais forte que sobrevive, nem o mais inteligente, mas o que melhor se adapta às mudanças”.
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