Mari Pavanelli fala sobre seus processos criativos e as aflições escondidas por trás de sua explosão de cores
Por Patrícia Mamede
Mari Pavanelli é artista visual, natural de Tupã e atualmente mora em São Paulo. Sua trajetória no mundo da arte se iniciou há treze anos, através de um desejo que carrega consigo desde sempre: viver no caminho do autoconhecimento. Antes de ter o título de artista, Mari trabalhou no mercado financeiro por anos e passou a se questionar sobre a realidade na qual estava inserida, “as coisas que eu estava vivendo não faziam muito mais sentido para mim”. Ainda carregando um forte desejo por se conhecer melhor, decidiu fazer algo diante de sua inquietude e curiosidade e foi às ruas, “comecei a pintar pelas ruas de São Paulo, com o graffiti. Adorava sair e fotografar a cena urbana. Adorava como a cidade se comunicava comingo”.
Dois anos depois, passou a se dedicar exclusivamente ao seu processo artístico. O tempo que passou atuando no banco a ajudaram a criar uma responsabilidade financeira, o que lhe permitiu administrar sua renda de modo inteligente para que
pudesse seguir seu desejo de maneira segura. Ao deixar de receber um salário fixo, Mari entendeu que precisaria juntar dinheiro, mudar suas despesas e reduzir seus gastos para fazer o necessário para seguir seu sonho, “você tem que voltar o seu foco e a sua atenção para outras coisas, não desistir, continuar, mas ter essa flexibilidade de poder ir dançando com essas imprevisibilidades da vida autônoma”.
Nascida e crescida no interior, Mari conta que carregava um certo pânico diante da possibilidade de se mudar para a grande metrópole, “o meu maior medo de vir para São Paulo, além da violência que a TV vende, era que não tinham árvores”. Bombardeada por imagens de prédios e concreto, a artista pensava que a natureza – algo extremamente importante para si – era inexistente na capital, “de fato, é muito
difícil. Se você sai de algumas áreas da classe média alta e vai mais para as bordas, não tem mesmo”. Todavia, seus pais tinham o costume de vir bastante para São Paulo, então, aos poucos, Mari foi acostumando os olhos gradualmente. Além disso, foi chegando pelas beiradas. Morou em algumas cidades ao redor da capital e foi se instalando devagar.
Como toda cidade grande, com suas bocas e dentes enormes, São Paulo é um lugar fácil de se sentir devorado. Consciente disso, Mari reconheceu que precisaria ela mesma desenvolver uma fome maior que o ambiente, “eu preciso devorar essa cidade e não deixar ela me engolir. Eu vou ter que fazer isso primeiro”. Chegou com o objetivo de fazer faculdade e construir uma carreira, “e eu fiz tudo isso”. Mas,
quando a pressão do mercado começou, Mari decidiu que seria a hora de pensar em novas alternativas, “comecei a pintar numa busca de autoconhecimento, e isso foi, é, e será o maior foco da minha vida”.
À primeira vista, as obras de Pavanelli, por serem muito coloridas, podem despertar uma sensação de alegria, mas seus trabalhos são desenvolvidos em meio a sentimentos, por vezes, carregados de melancolia e angústia. Sem medo de sentar de frente para si, Mari conta que sempre busca entender seus momentos melancólicos, geralmente muito ricos em questionamentos. A artista diz que a arte é a maior ferramenta para a investigação de seu inconsciente, “a arte me ajudou e me ajuda todos os dias. Nos momentos em que me sinto perdida, ou fora de mim, é através do meu trabalho que eu consigo me reconectar”, relata.
Mas seu ímpeto e coragem para se auto analisar foi uma conquista de muito trabalho, “por muito tempo era difícil para mim falar sobre tristeza, eu não queria passar isso para o meu trabalho porque era meio que uma missão pro mundo; eu queria passar uma mensagem de positividade, sempre”. Mari reconhece que o colorido de suas obras maquia, muitas vezes, o soturno, que se ofusca por trás das
cores fortes. No entanto, esclarece que, hoje, seu trabalho fala muito mais sobre anseios, momentos melancólicos, faltas, saudades e vazios. Esses sentimentos, mesmo singelos e tímidos, presentes em seus desenhos, podem ser percebidos através de um olhar atento e perspicaz. Uma das características fortes nas obras da artista é a presença de figuras de mulheres. Ainda, essas mulheres também têm, entre elas, semelhanças como, os olhos fechados, as bocas retas e a natureza envolvendo seus corpos.
Ao unir a palavra ao abstrato, o processo criativo de Mari toma início em seus cadernos, “é muito bom, e importante para mim, organizar as minhas emoções de palavras. E, às vezes, eu consigo transcrever os sentimentos através de elementos. Como eu sinto algumas coisas são como alguns elementos vão surgir no meu trabalho”, e isso não somente através das figuras de natureza, mas é algo que atravessa todas as camadas de sua criação. Por vezes, nos ápices de seus bloqueios criativos, sem conseguir pintar, Mari voltou às páginas para lhe ajudar a destrinchar os próprios sentimentos. No entanto, enfatiza que esse modelo não é uma regra. Ora busca o auxílio das palavras, ora vai direto de encontro ao pincel. Muitos de seus trabalhos, inclusive, escondem atrás da finalização, palavras que a artista escreveu no branco antes de iniciar a pintura, “tenho muitas telas que têm outras pinturas por baixo”.
Para a artista, as características de seu trabalho são também um reflexo da cultura brasileira. Em suas viagens a trabalho, observando as obras de diferentes artistas de diversas culturas, Mari diz que a arte latino americana, em geral, é embalsamada por cores. Por meio de suas experiências pintando fora do país, as pessoas reconhecem, quase instantaneamente, sua herança latina, justamente pela seleção
de cores presentes em suas telas, “essa explosão de cores tem muita veia latina. Existem muitos artistas coloridíssimos por aí, mas se você vai para alguns países da Europa, que são mais frios, geralmente são cores mais sólidas e mais frias”. Outra observação que a artista faz sobre a arte brasileira é a falta de reconhecimento que os profissionais recebem, muitas vezes pelo fato da arte ser subvalorizada no país, “mas o Brasil é muito rico, em tudo. O Brasil é incrível. É uma pena que às vezes não tem essa valorização; esse reconhecimento”.
Agora que você já sabe um pouco mais sobre Mari e o que atravessa suas obras,
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